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Cop26: Do que depende o sucesso da conferência global do clima?

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No último domingo 31 de outubro, durante a cerimônia de abertura da COP26, evento marcado por negociações críticas sobre mudança climática, o primeiro-ministro do Reino Unido Boris Johnson alertou outros líderes de quase 200 países que a humanidade “há muito tempo atrasou o relógio da mudança climática”, e advertiu que, se essa questão não for levada a sério hoje, ” será tarde demais para nossos filhos fazerem isso amanhã”.

A grande preocupação é a escala do desafio e o enorme escopo de ações necessárias para conter o aumento da temperatura.

Para limitarmos o aquecimento a 1,5 grau centígrado, as emissões globais devem ser reduzidas à metade até 2030, e chegar ao chamado Net Zero até 2050. O relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) de 2021 ressalta que ainda é possível atingir o alvo de 1,5 grau, mas somente se uma ação sem precedentes for tomada agora.

O problema é que os planos de ação apresentados pelos países em 2015 não foram ambiciosos o suficiente para limitar o aquecimento global. A COP26 só poderá ser classificada de bem-sucedida se um número relevante de governos apresentar novos planos. Até agora, 86 países, juntamente com os 27 Estados-Membros da União Europeia, fizeram isso.

O sucesso em Glasgow também exige que os países desenvolvidos honrem a promessa que fizeram em 2009 de mobilizar US$ 100 bilhões por ano até 2020 para apoiar a ação climática nos países em desenvolvimento. Os números oficiais só estarão disponíveis em 2022, mas está claro que a meta não foi atingida no ano passado.

Nesse sentido – assim como em outras questões importantes – a cúpula de líderes do G-20 realizada sábado (30/10) e domingo (31/10) em Roma não inspirou otimismo. Líderes de nações mais pobres esperavam ver emergir muito mais dessas reuniões. Houve progresso em termos de uma promessa significativa de zerar as emissões de carbono por volta da metade do século, mas, pelo que parece, não será suficiente para manter a meta de aquecimento de 1,5 grau.

Cientistas e ativistas do clima dizem que a conferência de Glasgow precisa ver um compromisso com grandes e rápidas reduções também nas emissões de metano, e um planejamento muito mais detalhado para adaptação e resiliência, para que os países sejam mais capazes de resistir aos choques climáticos e aos eventos meteorológicos extremos.

A questão econômica

A COP26 definirá a agenda climática nas próximas décadas, e muito dependerá dos países desenvolvidos intensificarem seus esforços. Mas, enquanto isso, os líderes das nações mais ricas também enfrentam uma crise de caixa e de energia, ambas em parte devido à pandemia do coronavírus. Alguns economistas têm alertado que, na corrida para fazer promessas, os líderes políticos ocidentais estão criando expectativas que dificilmente serão capazes de cumprir sem maiores danos econômicos e consequências eleitorais.

A enorme transformação que será necessária e os grandes custos envolvidos, muitos dos quais provavelmente serão arcados pelos contribuintes, é um desafio até mesmo para os países mais ricos. Os economistas se perguntam: é possível cumprir metas ambiciosas de ação climática sem prejudicar as economias que já lutam para recuperar o equilíbrio após uma pandemia que interrompeu as cadeias de abastecimento, detonou os mercados de energia e aumentou a inflação?

Os legisladores e políticos em geral enfrentam um dilema entre o alto custo inicial de avançar rapidamente em direção às metas de carbono zero e o dano de longo prazo ao crescimento econômico causado pela mudança climática, se essa ação for atrasada. Glasgow provavelmente destacará esse dilema.

O sucesso da COP depende de promessas que possam ser cumpridas, e de ações imediatas por parte dos governos.

Net Zero até 2050

Entenda o que significa a principal promessa da COP26

Principal fonte de emissões globais, o setor de energia é a chave para responder ao desafio climático mundial. Apesar de muitas promessas e esforços dos governos para combater as causas do aquecimento global, as emissões de gás carbônico da energia e da indústria aumentaram 60% desde a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, assinada em 1992. Os compromissos e ações globais estão crescendo, mas ainda estão aquém do que é necessário para limitar o aumento das temperaturas globais a 1,5 °C e evitar os piores efeitos das mudanças climáticas.

O plano global conhecido como Net Zero significa forçar uma queda brusca no uso de carvão, petróleo e gás pela humanidade. Isso requer medidas como a suspensão das vendas de novos carros com motor de combustão interna até 2035 e a eliminação progressiva de todas as usinas de carvão e petróleo até 2040.

Tecnologia

Zerar as emissões de carbono até 2050 requer a implantação massiva de todas as tecnologias de energia limpa disponíveis entre agora e 2030. Para a energia solar, é equivalente a instalar uma unidade do maior parque solar atual do mundo quase todos os dias. O investimento anual em energia limpa em todo o mundo precisará mais do que triplicar até 2030, para cerca de US$ 4 trilhões. Isso criará milhões de novos empregos, aumentará significativamente o crescimento econômico global e promoverá o acesso universal à eletricidade e à cozinha limpa em todo o mundo até o final da década de 2030.

A maioria das reduções nas emissões de gás carbônico até 2030 vem de tecnologias já existentes no mercado. Mas, para atingirmos a meta em 2050, teremos que contar com tecnologias que estão atualmente em fase de demonstração ou protótipo. Grandes esforços de inovação devem ocorrer nessa década, para trazer essas novas tecnologias ao mercado a tempo.

A geração de eletricidade precisará zerar as emissões de carbono globalmente em 2040, e e se preparar para fornecer quase metade do consumo total de energia no mundo. Isso exigirá um aumento significativo na flexibilidade do sistema elétrico – como baterias, combustíveis à base de hidrogênio e energia hidrelétrica – para garantir suprimentos confiáveis.

Em 2045, novas tecnologias de energia serão difundidas. A grande maioria dos carros nas estradas funcionará com eletricidade ou células de combustível, os aviões dependerão principalmente de biocombustíveis avançados e combustíveis sintéticos, e centenas de plantas industriais usarão a captura de carbono ou hidrogênio em todo o mundo.

O setor de energia global em 2050 será amplamente baseado em energias renováveis, sendo a energia solar a maior fonte de abastecimento. Alcançar esse futuro mais limpo e saudável dependerá de um enfoque único e inabalável de todos os governos, trabalhando em estreita colaboração com empresas, investidores e cidadãos. Também exigirá maior cooperação internacional entre os países, principalmente para garantir que as economias em desenvolvimento tenham o financiamento e as tecnologias de que precisam para chegar ao Net Zero a tempo.

Alcançar o Net Zero até 2050 exigirá nada menos que a transformação completa do sistema global de energia.

As tecnologias de energia renovável, como a solar e a eólica, são a chave para reduzir as emissões no setor elétrico, que é hoje a maior fonte de emissões de gás carbônico. No caminho para o Net Zero, quase 90% da geração global de eletricidade em 2050 deverá vir de fontes renováveis, como a energia solar fotovoltaica e a eólica, que, juntas, respondem por quase 70%.

Muitas soluções de eficiência energética para edifícios, veículos, eletrodomésticos e indústria estão disponíveis hoje, e podem ser ampliadas rapidamente, criando empregos no processo. Com o uso em grande escala dessas soluções, podemos aumentar a taxa média de melhorias na eficiência energética na década de 2020 para cerca de três vezes a média das últimas duas décadas.

À medida que a geração de eletricidade se torna cada vez mais limpa, a eletrificação de áreas anteriormente dominadas por combustíveis fósseis surge como uma ferramenta crucial em toda a economia para reduzir as emissões. Isso ocorre por meio de tecnologias como carros elétricos, bombas de calor em edifícios e fornos elétricos para a produção de aço.

A bioenergia sustentável oferece reduções de emissões em uma ampla gama de áreas, incluindo combustíveis de baixa emissão para aviões, navios e outras formas de transporte, e a substituição do gás natural por biometano, para fornecer aquecimento e eletricidade. A bioenergia sustentável também é essencial para levar soluções de cozinha limpa para os 2,6 bilhões de pessoas que atualmente não as têm.

A tecnologia de captura, utilização e armazenamento de carbono (CCUS) contribui para a transição para o Net Zero de várias maneiras: lidar com as emissões de ativos de energia existentes, fornecer soluções em alguns dos setores onde as emissões são mais difíceis de reduzir (como o cimento), apoiar o rápido aumento da produção de hidrogênio com baixas emissões e permitir que parte do gás carbônico seja removida da atmosfera.

O hidrogênio e os combustíveis à base desse elemento precisarão preencher as lacunas onde a eletricidade não pode substituir os combustíveis fósseis, e onde os suprimentos limitados de bioenergia sustentável não conseguem atender à demanda. Isso inclui o uso de combustíveis à base de hidrogênio para navios e aviões, bem como em indústrias pesadas, como aço e produtos químicos.

O Net Zero até 2050 não pode ser alcançado sem o apoio sustentado e a participação dos cidadãos. Mudanças comportamentais, particularmente em economias avançadas – como substituir viagens de carro por caminhadas, ciclismo ou transporte público, ou abdicar de um voo de longa distância – são responsáveis por cerca de 5% das reduções de emissões cumulativas.

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